5.4.06

Quero ir trabalhar. Não quero estudar mais!


O dia estava frio e de chuva. Luís lutava com o vento. O guarda-chuva já tinha uma vareta estragada, e tinha amanhecido de Inverno. Dizem que em Abril águas mil, e naquela manhã o céu resolveu despejar toda a água do mundo sobre Luís.
Eram oito e dez e as aulas começavam às oito e trinta. Tinha que andar rápido, mas com aqueles sapatos tão grandes não era fácil.
Os pais de Luís viviam mal e faziam um esforço enorme para criar os filhos todos. A vida não estava nada meiga…
O ordenado ao fim do mês, desaparecia como que por artes mágicas.
Por vezes Luís tinha sorte! A mãe do seu vizinho António, dava-lhe algumas roupas que já não serviam ao filho, embora fossem ambos da mesma idade. Nesses dias Luís ficava muito contente, tinha uma roupa nova para estrear!
Luís naquele dia, teve que levar uns sapatos um pouco maiores, que o numero que gastava - eram do pai - mas eram em borracha! Pelo menos, não chegaria com os pés todos molhados. Os sapatos dele estavam com as solas rotas!
Todos os dias, Luís fazia aquele trajecto para ir para a escola. Não era grande caminhada, mas também não era pequena. Ora… não justificava gastar dinheiro no autocarro. Mesmo que quisesse, também não o tinha, por isso tratava de dar à perna.
Naquele dia estava difícil. Segurar os livros e o guarda-chuva com aquela ventania…
O casaco, já estava a ficar todo molhado, e os livros só se safavam porque a mãe, os enrolou num plástico. Tinham custado caro, não se podiam estragar.
Perto da escola, o guarda-chuva não aguentou mais. A Mãe de Luís já lhe tinha dito - “Não te preocupes. Se ele se partir paciência, deita-o fora e vai depressa. Ele já está velhote…” Luís assim fez. Por sorte estava próximo!
Quando entrou no átrio, Luís era aquilo que se pode chamar, um pinto. Todo ele escorria água! Os colegas quando o viram, riram a bom rir. Estavam todos naquela idade, em que qualquer coisa faz rir. Luís bem tentava explicar que o guarda-chuva se tinha partido… mas os sapatos? Sim, os sapatos? Como explicar aqueles sapatos quase dois números maiores; de um modelo antigo e que faziam chelop, chelop ao caminhar?
Luís morria de vergonha dos colegas. Todos se riam dele e daqueles malditos sapatos cheios de água!
Como terão descoberto, que ele era pobre? Interrogava-se Luís.
Triste como a noite, lá foi para a sala, com os colegas de turma, atrás dele a rirem-se.
Apetecia-lhe ir embora e nunca mais ver aquela escola.
Nesse dia, quando chegou a casa, Luís disse ao Pai – “Quero ir trabalhar. Não quero estudar mais!”

Lobo
05 Abr 06
01.13 Horas

1 Comments:

At 8:51 da tarde, Blogger Yashmeen said...

A pobreza na infância consegue revestir-se de uma crueldade inimaginável e quase insuportável até mesmo para um adulto, porque as crianças normalmente são crueis e não perdoam a diferença... ainda bem que histórias como a do Luís são cada vez menos frequentes.

 

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